domingo, novembro 16

Alimento da alma

Calei todos os gritos do meu coração. Ele pedia por carinho, não há nada nesse mundo que o faça esquecer sua carência. Calei todos os gritos num copo de bebida doce e numa boca amarga. Gritei todos os meu medos... num gozo falso.

quinta-feira, novembro 13

Metido dentro de ti

Virgem nua
Um desejo 
em carne tua

Florir 
teu caminho
deleitar
meu corpo
em teu perfume

Colorir 
de vermelho-
-sangue
os versos 

de amor
que professo
em tua nua
sepultura

segunda-feira, novembro 10

Prometo teu fim

Vou me afogar dentro de você
pedir aos deuses teu sangue cru
me deleitar em teus braços
mastigar de tua carne
sorver de teus fluídos

Amansar esse medo
e no fim das contas

Meter em ti
meu espírito duro

E você irá gozar
de dor, de medo
de pavor!

sábado, novembro 8

Devaneios românticos

Já estou me vendo na cozinha apertada, o propósito é cozinhar alguma coisa comestível pro meu amor. Se vai sair, não sei, mas se é feito com carinho, há de se tragar com emoção.

Nos vemos deitados juntos, nem precisamos estar em cópula para nos sentirmos bem. Fazemos agrados um no outro, no rádio uma música a encher o ambiente, em nós dois, conversa mole, risos e paixão.

Me vejo junto da família. O primeiro encontro, eles me olhando meio assustados, o que eu tinha feito para conquistá-lo, sendo tão normal, sem grande beleza e tudo isso. O aperto de mão do sogro, o olhar meio azedo da sogra. A irmã perdida em seu próprio mundo adolescente.

Eu vejo até nossa primeira briga e depois a foda da reconciliação. Eu vejo tudo, e ele, beijando outra na tela do cinema, não vê porra nenhuma.

segunda-feira, novembro 3

Matando a gula

Doce de amendoim com cream cracker. Um pedaço de doce e um pedaço de sal. Os olhos observam o movimento da boca no espelho. É uma boca bem pequena, fina. Rebola o alimento de um lado para outro, um pedacinho de amendoim perdura no canto dos lábios, não usa a língua para tirá-lo, mas passa o dedo de leve por ali. Os tímpanos estouram com rock n roll, a boca se satisfaz com doce e sal, a barriga incha e o coração pesa. É saudade e é tédio. 

domingo, novembro 2

Sofrimento

Sentada na sarjeta e sobre mim, chuva fina. As lágrimas misturam com as gotas de água e ninguém percebe que sentada aqui, está uma alma atormentada. Um desejo incontrolável de fumar, mas essa chuva não me permite esse gosto. Tenho vontade de gritar alto. Quero que escutem meu desamor, quero compartilhar essa dor. Alguém que me ouça!

Sentou ao meu lado alguém. Não viro meus olhos na direção do outro corpo. Sinto que o acumulo de água na região dos olhos dele está maior que permite a fina garoa. Põe as mãos em concha e acende um cigarro. Consigo um trago antes de apagar. Encosto meu corpo ali. Não falo nada, ele entende tudo. Ele também está sofrendo.

Somos dois corpos andando na escuridão. O frio que nos consome, também nos aquece.

sexta-feira, outubro 24

Teso

Quero gosto de sangue na boca
carne podre entre os dedos
imundícies sob os passos 
pele humana e osso infante

Quero gozo de sangue nas coxas
mordidas e ataques ferozes
briga pelo poder, rasgos profundos
amor e morte

De você!

quinta-feira, outubro 23

De mim

Dizem que eu sou imortal
que não vou morrer nunca
que da minha carne 
não sairá a alma

Dizem: tédio imortal
tipo chato, que nunca
tira das vistas essa carne
podre de alma

domingo, outubro 19

Em ti

Língua enroscada na orelha
desejo desenhado em lábios
os suspiros de prazer
as mordidas na bochecha
o arranhar da barba
o deslizar da saliva
o líquido da excitação
as covas preenchidas
os gritos em gozo
a troca de beijos úmidos
os carinhos namorados

sexta-feira, outubro 17

Eu me rendo

Penso que não poderia mais viver com essa dor no meu peito. Escrevo para desafogar as mágoas e para dirimir as amarguras. No mundo de prazeres que pensei habitar, nem restam sombras ou cinzas. Restou em meu peito pranto molhado e amargura condensada. As lágrimas caem dos olhos e molham meu travesseiro, o ranho escorre do nariz, formam poça no lábio superior, a dor é tamanha que nada poderia fazer para retirá-la de cima de mim. Mas eu penso me render essa noite às amarguras. De manhã vou tomar banho, passar a maquiagem e sorrir para o mundo. Uma noite de solidão e uma vida inteira para matar esse sentimento maldito que criou raízes no meu coração. Amanhã.

quarta-feira, outubro 15

Passional

E a gente brigou por uma coisa tão boba. Nem lembro mais o motivo. Lembro sim, de tê-la deixado sozinha na mesa do bar. Sozinha. Nunca mais voltei a ver seus olhos escuros nem seus dentes levemente tortos. Nunca mais ouvi aquele riso de felicidade nem suas broncas passageiras. Deixei a mulher sozinha e sozinho estou eu hoje. Naqueles dias, quando eu a tinha, fazíamos castelos no ar e os desmanchávamos com as linhas tortas de nossas escritas. Eu recitava poesias de amor e ela regurgitava tudo em contos de terror. Naquele dia da briga, eu disse à polícia, brigamos e eu a deixei na mesa do bar. Notei que tinha um cara de olho nela, talvez ele possa saber de alguma coisa? Como ele era? Não poderia me lembrar exatamente, alto, forte, gordo até, bem diferente da minha magreza loira. Não, o garçom não lembrava de nada, mas eles nunca lembram sem você molhar a mão deles. Naquela noite, eu fui dormir com as unhas cheias de sangue. Tive o infortúnio de atropelar um cachorro. Botei ele na traseira do carro, mas não levei no veterinário, pois não havia nenhum aberto àquela hora. A polícia vem dizer que o sangue é dela, mas isso é impossível, eu a deixei, sozinha, na mesa do bar. Aquela vaca, deve ter feito isso para me incriminar. Deve ter espalhado sangue pelo meu carro, e saído em uma longa viajem, nessa hora, deve estar rindo às largas enquanto eu estou aqui, encarcerado e acusado de crime. Mas eu não cometi nenhum crime, a deixei fofa e bela, sentada na mesa do bar. Vadia!

segunda-feira, outubro 13

Linda

dessa forma que a vejo
formosa notas musicais 
aroma de flores e mar
dançando pelas ondas
velejando em minh'alma
fazendo fantasias em mim
provocando o macho interno
da mulher que sou

Linda!

sexta-feira, outubro 10

Ritual

As coisas estão quentes por aqui
desejo em carne viva
panela no fogão
espera

Vamos celebrar o amor à vida
comendo carne crua
sal e pimenta
gozo

terça-feira, outubro 7

Trato

queria sua pele aqui
encher de mordidas
linguá-la
Tirar seus suspiros
seu gozo propiciar
seu falo engolir

por todos os prantos

domingo, setembro 28

Definhar

Venho me sentindo morta, todas as alegrias efêmeras, todos os sorrisos forçados, todas as gargalhadas de desespero. Um forte sentimento de solidão, um aperto no fundo da garganta, suspiros despejados pelos cantos, um arrastar de ombos contra a gravidade, a alma caída, o ânimo de prosperar findado, a vida em geral, perdida.

Pergunto aos meus botões, que me trará felicidade? Que preencherá o vazio que vai no coração? Não busco por dinheiro, nem por amor, nem por companhia. Não busco as coisas vãs nem os risos alheios. Não busco por nada, e por nada buscar, não vejo alegria nos meus olhos. Não vejo alegria, pois eles não se abrem mais, como eu já disse, estou morta por dentro, apenas definhando por fora.

quarta-feira, setembro 24

Nos ouvidos surdos

Quando o riso contagia
nessa louca tortura
nesse delírio enojante
o viver de passados 
podridão na alma
cansaço de fazer bem
um maldito desejo
uma morte perene
e a sensação de sentir
que a morte é próxima
que da vida nada se leva
nem releva

segunda-feira, setembro 22

Masturbação

Tava me sentindo depressiva
com vontade de chorar e tudo
os olhos ardendo, mas secos
a música boa nem me animava
de tanto em tanto a solidão me pega
se eu sou dessas de sofrer sozinha?
não posso negar o fato
desci a mão pelos seios
acariciei a barriga
senti arrepios
usei dos dedos seu tato
um gozo propiciei
continuo sozinha, foda-se

já estou animadinha!

sexta-feira, setembro 12

Banido

Tinha nos olhos o brilho da saudade
Compunha inspirado em dores
trazia no peito os dedos apertados
sorria seus dentes tortos, chorava
Incompreendido logrou muitas esperanças
Acabou sozinho e abandonado
no meio dos que diziam lhe amar

domingo, agosto 24

Restos

Das nossas conversas restaram ecos. Dos nossos risos, memórias. Das nossas alegrias, a lembrança. Do nosso amor, um filho. Da nossa realidade, um desgosto. 

sábado, agosto 16

Chuva na janela

Fumando meu cigarro
filtro branco
Revoltada
seu sabor amargo
chupo uma bala
de cereja

É paliativo
continua o amargo
igual ao coração
o meu

Sozinha nessa paragem
fumando o que odeio
bebendo tragos
de saudade
suas



sexta-feira, agosto 15

Foi sexo

Mordida
no ombro
uma marca
uma tatuagem
de saliva
o chupão
no pescoço
o gozo do beijo
o riso incontido
os braços agarrados
os suspiros
uma puta
e um puto
diversão sexual


segunda-feira, agosto 11

Discussão existencial


— Tu devia parar com a procrastinação.
— Vou.
— Hoje?
— Quem sabe?
— Caraca, tu é de quebrar as pernas.
— Como poderia não ser? Olho pra dentro de mim mesmo e o que? Vazio. Qual o sentido?
— Você já deveria ter descoberto… pela quantidade de tempo que está aí, sentado nesse sofá.
— A televisão me ajuda.
— Há. Te ajuda em que? Ajuda em procrastinar.
— Que é isso mulher. É nela que eu encontro um objeto para preencher o meu vazio.
— Sei. Não quer ajuda pra preencher esse vazio?
— Só ficar quieto aqui, vendo o Programa Vazio da Tarde, obrigado.
— Tu é muito descarado. Tá com vazio, tá? Vou te comprar um consolo, bem grande e gordo… Ué, vai onde?
— Preencher meu vazio cortando a grama do quintal.
— He… Mais útil assim. Cuidado com o buraco, querido, pra não cair mato lá.

— Te ferrar, mulher!

sábado, agosto 9

Eu também vou

Uma droga de nome coração
um aperto e uma batida forte
um agarro e o bichinho voa
voa de tristeza às vezes, 
não
às vezes é só de tesão!

terça-feira, agosto 5

Conto: Abate


É que tinha uma réstia de luz entrando pela janela. Meu coração pulsava fraco com essa claridade, esperando a escuridão para se libertar. Na fraca luz mirei meus olhos pelo espelho, negritude rodeada de uma gosma branca, nos lábios descascados, aquele sorriso de quem entende da malícia. Os dentes quase invisíveis na escuridão, as axilas molhadas, o suor acima no buço, o cobertor esquentando as costas, e o frio nos dedos dos pés, tudo denunciando meu medo da luz. Na cabeça os piolhos em polvorosa, brigando pelo meu sangue, ou caspa devorando-me em coceira, mas não coço, imagino seus dedos mornos sobre mim, brincando comigo no meio da noite, mordendo pra longe esse medo, de olhos fechados.

É que essa luz denuncia, lábios inferiores mordidos, língua sobre lábios secos, prelúdio de sua chegada, saliva de sua presença, angústia de sua alma. Fico já em guarda, sem calcinha, sem calça, sem meia, sem pudor, pernas abertas, frêmito no corpo todo, esperando a escuridão tocar minhas partes, preencher meus vazios expostos pela luz, meu ventre inchado, a criança mexendo, sua chegada silenciosa.

Eis que da luz não há mais réstia, o cativeiro colorido do sangue delas desaparece ao meu olhar. A noite chegou contigo, e veio arrebatadora. Posso sentir sua respiração sobre mim, além do vento com o abrir da porta. Ao longe o uivo do cão, mais perto a sirene de polícia, e cá você, pronto para mim, pronto para me satisfazer, pronto ereto.

Nessa escuridão ouço apenas o som da corrente batendo contra a parede, no ritmo do nosso amor desvairado. Mal posso conter meus suspiros, você entra em mim com força, seus trancos raivosos rivalizando com o metal. Tudo às escuras alcançamos o êxito, engolimos nosso amor dentro de nossa imensidão, o gozo escorre perna abaixo, o suor inunda minhas papilas gustativas, um clarão sinistro e o cigarro está acesso, o olho vermelho passa de boca em boca, uma dança macabra refletida no espelho.

A noite é passageira, quando do sol querendo despontar estou sozinha, rodeada de imundícies, saciada de nosso amor selvagem. Quando da manhã meu coração pulsando fraco, percebo na parede, fruto e feto de nosso amor, os ossinhos pendurados, mortos de fome talvez, mas ainda mortos. Conto seus corpos, seis, sete, vinte? Quem sabe, estão aí me encarando, evito seus olhos e questionamentos, busco em meu ventre uma vida pulsante, ainda vive. A luz faz-me ver, com olhos escancarados, o horror ao qual estou acorrentada, uma parede colorida em sangue arterial, um teto decorado com ossos infantis, um espelho mais cruel que a realidade.


Fecho os olhos com força. Buscando a escuridão atrás das pálpebras, mas a negritude é colorida, luzes malditas pintam meus olhos, piscam sobre minha desgraça. Falta o ar nessa hora, chorar é para os fracos. Anseio pelo fim dessa luz abrasadora, a criança muda de posição, eu mudo de lado no chão duro. Um gole de urina podre, um pedaço de fungo e o café da manhã vai me sustentar até o banquete da noite. Os ossos tremem de medo, medo pensam eles, desejo já sabe o cérebro, apenas desejo. Que me venham às entranhas o carneiro pro abate.

domingo, agosto 3

Notas de despedida

Tudo começa com um despertar preguiçoso. As más lembranças ainda não se apresentam aos processos da memória. Um espreguiçar, um levantar atordoado, um suspiro de pesar para deixar a cama quente, no entanto solitária. Quando se dá conta da ausência são os olhos que derramam sua dor em lágrimas, o nariz entupido e um soluçar fraquinho. A face distorcida no espelho.

Morder os lábios até sentir o ferro do sangue. Abrir pequenas feridas pelo corpo, ver brotar o sangue, sentir enjoos, comer comida estragada, horas a fio no banheiro, um medo constante de deixar a casa, uma vontade esquisita de se sentir viva.

O silêncio dentro do quarto é preenchido com música ruim, mas não toca mais que trinta segundo antes de ser trocada, por outra e outra. O acesso à internet é constante, um abrir e fechar de páginas, sem destino.


A página aberta de um documento office pisca para seus olhos. Os dedos deslizam sobre a tela. Uma nota de despedida. Mais uma. Fecha e salva com o nome de “SuicídioXXV”. Amanhã eu cometo, pensa. Amanhã.

sábado, agosto 2

Hoje vou morrer

Tem tempos já estou insatisfeito com a minha vida. É sim, as coisas vão de mal a pior, minha esposa anda me traindo, minhas filhas se prostituem, minha mãe está saindo com um garoto de 22 anos e eu? Eu estou em casa, tomando remédios para segurar a dor de cabeça que os chifres dão. A colheita esse ano foi fraca, o dinheiro do banco acabou, estou até aceitando o gozado cascalho das meninas para comprar comida! Não, a coisa não vai bem. É hora de acabar com tudo. O leite da Mimosa está quente e espumando na caneca, a manga verde já cortei em finas tiras, só falta comer. Continuarei sendo corno, mas do túmulo ninguém enxerga o chifre.

domingo, julho 27

Meu amor feminino III

Estamos juntas em carne e alma. Levamos um amor de profunda pureza, quase etéreo. Ela satisfaz minhas agruras, eu como as tristezas dela. Quando estamos juntas, somos uma. Seu cabelo vermelho, sua boca cor-de-rosa, seus olhos negros. Meus lábios secos de olhos brilhantes contemplam sua magreza, suas ancas que se movimentam ritmadas sobre mim. Nossos corações batem juntos, batem descompassados, batem agoniados pela distância entre o café da manhã e o almoço no restaurante, e a agonia perdura até a noite, quando nos movemos em uníssono uma sobre a outra, colhendo os suspiros, entesourando os segredos, tragando as respirações. Da colcha vermelha, a lavagem não pode tirar o aroma de nosso gozo, nem a maciez de nossas entranhas.

domingo, julho 20

Despedida

hoje amanheceu chovendo
meu coração empapado
minhas vestes úmidas

hoje foi um noite difícil
daquelas de fazer tremer
o frio cortante

amanhã não vai amanhecer
amanhã deixará de existir
cadáver faço de mim

segunda-feira, julho 14

Liberdade

Tamborila o dedo no ritmo da música. O painel do carro queima de sol. O vento quente vem da janela aberta. O gosto da liberdade. Andar sem rumo, seguir as marcas da estrada, ir pra lugar nenhum, ir pra todo lugar. O cigarro no canto da boca, a música alta, a pista vazia, o céu azul, o óculos largado no banco do passageiro, o batom vermelho na boca. Quem se importa em ficar perdido, perdidos estão todos, deixe a estrada te levar, para longe das pessoas, para longe da metrópole, para longe dos moribundos com fome. O ponteiro da gasolina está no vermelho. Está na hora de acabar com a viajem, vamos fechar com chave de ouro. O alvo é o caminhão maior, para evitar maiores danos. 100 km/h, 120, 140, 160 e colisão. Falta o cinto, o corpo voa para a liberdade, a cabeça racha no asfalto, o corpo tremelica, o susto do pobre motorista, o infarte dele, a morte sua. A morte sua, o sorriso na sua boca. A liberdade veio te carregar nos braços.

sexta-feira, julho 11

Cachorro

Ficou me encarando
seus olhos pérfidos
Mil promessas nos lábios
um sorriso de sacanagem

A voz dando arrepios
tremores pelo corpo
sou garota má
tome-me

O vídeo acabou
e a realidade
me fez chorar,
sozinha

quinta-feira, julho 10

Nostálgico

É tudo meio triste aqui
das sombras nos cantos 
às velas acesas

Tudo rescende à maldade
de uma paixão que veio
mas o tempo se encarregou
de matar

sexta-feira, julho 4

sábado, junho 28

Solidão

No rádio música brega. Na noite uma lâmpada amarela acesa. Na madrugada um vazio no peito. Uma vontade de não sei o que, um desejo reprimido que não passa. Na solidão do quarto os olhos ardem, o buraco no peito aumenta, o desejo de alguém se faz mais forte. Na luz artificial da madrugada os olhos estalados, vermelhos, acompanham a fumaça do cigarro. A alma rodopia com ela, desfazendo-se ante os olhos, e a saudade lá, apertando as bordas do buraco, tudo mais profundo. 

sexta-feira, junho 20

Língua

Eu estava aprendendo alemão, ele português. Treinávamos juntos, eu conversava na língua dele, ele na minha. Na hora da transa usávamos uma língua só.

quarta-feira, junho 18

segunda-feira, junho 9

Faíscas do antigo

Era um detalhe sem importância
relegado aos desígnios do passado
relíquia entesourada da memória
que volta e meia surgia na discussão

Ela trazia o assunto para a conversa
ele saia brilhantemente pela tangente 
ela esquecia do assunto por hora
ele rememorava uma e outra vez o prazer

segunda-feira, junho 2

Meu amor feminino II

Quando nos encontramos pela segunda vez, eu conhecia aquelas curvas macias de memória. Lembrava o som de seu gozo, o riso de sua satisfação e o sabor de sua língua, café e cigarro. Ela não me sorriu. De fato estava com uma cara raivosa. Veio até mim e me deu um tapa, na multidão. Assustamos as pessoas ao redor. Seus olhos marejaram, os meus escorreram lágrimas. Nos abraçamos, e tocamos nossas línguas sem nos importar com a plateia. Alguns ficaram revoltados, outros aplaudiram, eu não ouvi nada, estava finalmente nos braços dela, e minha agonia tinha acabado. 
Quando acordei ao lado dela, de novo a colcha vermelha, fiquei contando sua respiração, as pintas do nariz, os pelos da sobrancelha, e não fui embora até ela acordar e me dar o beijo da despedida, e a promessa do amanhã.

Copo de café

viraste um copo de café sobre a mesa
aquilo escorreu numa enxurrada
depois passou a pingar gotas grossas

parece nosso amor naquela leveza
os corações batendo em debandada
e foi embora, caindo de mim grossas lágrimas

terça-feira, maio 27

Sombra

Pessoas me olham na rua
Olho de volta
meus olhos sem vida
Ninguém nota quão morta eu estou
Ainda respiro, transpiro, mas por dentro
por dentro sou pó

sexta-feira, maio 23

De amor e solidão

Eu te amo tanto. Se pudesse projetava meu amor para fora, envolveria você em uma capa protetora de conforto. Meu amor é tão grande que poesias e músicas não dariam conta de sua imensidão. Meu amor por você é transcendente, é infinito, é além-mar.

Eu te amo tanto, que meu desejo é você aqui mais uma vez, para abraçar, cheirar, morder, apertar e sentir o gosto da sua satisfação. Mas não posso, pois meu amor, agora mesmo, não vive mais. Morto está, um estúpido acidente, e você não há mais, nem para me consolar quando preciso, nem para me confortar quando necessário, ou acalmar minhas dores e insanidade. De você, meu amor, só peço seu coração.

Plantá-lo-ei num vaso negro. Dentro dele há de germinar uma rosa vermelha.


terça-feira, maio 13

Arrepios

Gosto de sentir arrepios
Saber o corpo estremecendo
O fechar prazeroso de olhos
Seja um arrepio autoinduzido
Seja um arrepio de corpo externo

domingo, maio 11

Tudo às Mães

Mãe é aquela que te olha e diz quão ridícula você está,
mãe não mente!
Mãe é aquela que fala o que todo mundo tá pensando,
mãe quer o seu bem!
Mãe é aquela que te dá um chacoalho bem necessário,
pra você deixar de fazer merda
Mãe tava lá quando você mais precisou, e vai continuar,
Mãe é pra se estimar, mas às vezes também dá raiva,
mas mãe é pra ser perdoada, 
Mãe é mãe, mas também é mamãe, mama, mainha etc etc

sexta-feira, maio 9

Conto: Sangue na escuridão

No sereno de uma madrugada fria, meus dedos dos pés buscavam refúgio numa meia furada. As pernas estavam envoltas com calças de flanela e os órgãos genitais tinham mais um conforto, fraldas de plástico egípcio. Mesmo assim, minhas bolas estavam geladas. O tórax estava revestido de uma camisa de político da última eleição, “vote em mim, para o bem e para o mau”, e sim, ela tinha esse erro de português mesmo. Busquei conforto num cobertor azul pirata, como dizia mamãe, e me escondi da madrugada dentro do meu quarto, com mil velas acesas e um castiçal. Na janela, tijolo, na porta, pregos, nas paredes, tinta branca.
Estava me borrando de medo, medo da noite. Só se ouvia um uivo lá fora, uivo do vento e da árvore torta ao peso de seu soprar, o cachorro no quintal, ladrando para almas penadas, ou gatos, que é a mesma coisa, e o sussurro dos demônios que vieram para me atormentar.
Levantar da cama é um suplício. Um gole de água e dois comprimidos boca abaixo. E já posso sentir a calmaria começar dos dedos dos pés para as bolas e o cérebro. Tento correr para a cama, mas ela está tão longe, tão pequena, tão distante, que tenho vontade de cantar 'so far away'. Depois nada, a escuridão veio me buscar em suas asas compridas.

Eu não acordo, mas sou acordado. Quando passa o efeito das minhas pílulas de placebo, eu me pergunto, com certa resignação, o motivo de não deixar a maldita ao lado da cama, devo ter desenvolvido certo prazer irracional de dormir no chão, e as malditas bolas geladas.
Não, eu não acordei. Fui acordado por ela, de nome escuridão, que há contecido com minhas velas? O tremor já começou pela garganta, o suor gelado saindo dos poros mofados, as lágrimas querendo escorrer dos olhos, os dentes numa dança frenética de cima a baixo, as unhas buscando a palma da mão, e o medo visceral manifesto numa vontade incontrolável de defecar. Não, não. Não me atrevo a me mover, tenho muitas fraldas. As bolas dos olhos estavam criando vórtices em sua órbita, procurando luz na senhora negritude. E encontrou, atrás de mim tinha uma única vela acesa, bem fraquinha, quase morrendo. Tão rápido quanto um homem dando à luz seu filho intestinal poderia se mover, busquei conforto nesse pedaço de luz que entrava nos raios da minha visão, mas eis que, dei com ele, o corpo da garganta cortada me sorria com um rio de sangue fluindo dela. E me reconheci naquele corpo, mais jovem talvez. E o sorriso se expandiu numa careta, e ele andou para mim. Busquei pela pílula, mas dessa vez ele foi mais rápido que eu, jorrou seu sangue sobre mim, engoli um pouco, vomitei o resto, prostrei-me aos seus pés, pedi clemência, só mais uma vez.

quarta-feira, maio 7

Visitas noturnas

Eu não creio em diabo, mas todas as noites ele costumava me visitar. Chegava vermelho em sua masculinidade, abria minhas pernas e me possuía, com vigor. Derramava seu sêmen no meu ânus estéril e dizia, com voz gozada, quão seguro eu estava, que ele me cuidava, que me amava. Bendizia minha incapacidade de falar, e secava minhas lágrimas, dizia que chorar era bom para os dutos lagrimais. Até os dias de hoje sinto dúvidas se o vermelho era o sangue das fezes (tão proclamado pelas babás), ou a cor de seus olhos (que eu imaginava na única cor que presumia conhecer), se o aroma de enxofre era dele ou meu, se na escuridão dos meus olhos cegos eu realmente via sua luz rubra, seu contorno com chifres, sua língua boca afora. Não, não, minhas dúvidas são dolentes demais para rememorar.
Mas em meus sonhos, em todos os sonhos, em todas as noites – que pra mim não tem diferença, sinto a mesma dor, o mesmo medo, o sempre desespero que sou partidário, que não vivo sem, que me faz viver, para todos os dias gozar da vida, seu aroma fétido, sua cor escarlatina, seu tom ofegante, sua mordida cheia de dentes, seu sêmen de fogo. E no fim, para coroar minhas memórias, o rangido da porta e seu clique silencioso… se ele entrou ou saiu.

segunda-feira, maio 5

Confissão

Venho contando a você, sobre meu passado, há dias
dias em que procuro mais de mim em você
para sanar as feridas e tapar os buracos
Venho dependendo do seu amor, e compreensão
que não sou mais jovem e tola, mas bem velha acabada
que no fim de sua vida quer se ver livres das dores antigas
e dos erros cometido imprudentemente, jovem destemida

domingo, abril 27

Meu amor feminino

Eu estava almoçando num restaurante popular. Mais educadamente que o normal. Eu a vi. Eu me apaixonei. Eu nunca tinha me apaixonado por mulheres antes, ou seja, eu era heterossexual, mas veja só como são as coisas, eu nem a conhecia, mas estava apaixonada.
Ela não me olhou, senão quando eu estava indo embora, pois tenho pouca confiança, nunca chegaria nela. Ela chegou em mim. Sentou a minha frente e perguntou se eu estava partindo. Ela tinha gotas de Júpiter em seus cabelos, cantava a música que eu ouvia, e ela tinha mesmo, ela tinha. Saímos juntas do restaurante. Sentamos em um banco na praça, e conversamos. Sobre tudo, sobre ela, sobre mim, sobre meus medos, sobre os medos dela. Aquele dia eu não voltei para o trabalho, nem voltei para casa. Aquele dia acabou comigo deitada em uma cama de colcha vermelha, com uma mulher gostosa sobre mim, e acabou também a minha virgindade. Eu tinha 20 anos. Eu estava apaixonada pela primeira vez. Eu estava andando no ar. Quando eu olhei para ela dormindo ao meu lado, eu me perguntei o que eu tinha feito para conseguir aquilo. Eu não merecia. E eu fui embora.

quinta-feira, abril 24

Meu monstro

Hmmm... e tem um monstro
na minha cama, embaixo dela
ah, esse meu monstro safado
não faz a barba pra dar cócegas
esse ordinário cheio de charme
fica aí mesmo
que meu marido já chegou!

terça-feira, abril 22

Da vida

Na vida, não procuro nada
não peço por nada
e não espero nada

o que vier tá bom
o que chegar, chegou
ou quem parar, parou

assim não há decepção
mas parece que também
não há emoção

sexta-feira, abril 11

Coisas más

Fiz uma coisa má hoje
não ajudei a quem podia
não devolvi a quem devia
não respondi a quem queria

Fiz uma coisa horrível hoje
matei do tempo sua capacidade
extraí da verdade sua mentira
envenenei a alegria com falácias
deturpei o amor só de maldade

Fazemos coisas horríveis todos os dias
amamos quem não devemos
beijamos quem não queremos
agradamos quem não merece
invejamos quem não somos
à revelia de uma vida cheia de meias verdades e 
meias fedidas

quinta-feira, abril 10

Reflexão de tempo

Com muita frequência, eu me sinto velha
(velha cansada)
e não é coisa dos anos não, é da cabeça
(esgotamento)
das coisas que te fazem pensar em tempo
(ou memórias)
em coisas que você passou com penúria
(ou com folga)
pessoas que ficaram vivas no passado
(e estão no presente longe de ti)
e você se pergunta sobre sua idade
ou insanidade (?)

Convite sombrio

Vamos brincar de morrer?
Eu pretendo sua morte 
e você pretende morrer
E se a gente (você) morrer
juro que compareço ao seu funeral

quarta-feira, abril 9

Dando as mãos

Estava escuro 
tinha uma mão
segurando a minha
que bem estava
que bom
que pena
no presente 
só está escuro
minha mão,
vazia

segunda-feira, abril 7

Olhos seduzentes

Sempre pensei que tinha os olhos bem comuns
são castanhos, rodeado de cílios negros, belo formato
e admirava os olhos azuis, verdes, bem maquiados 
mas então, que me olho aos olhos! E bem, que belos são
têm umas raias mais escuras, um diâmetro perfeitinho

Se posso dizer uma coisa sobre eles, são especiais
e deixam de ser comuns, e afirmo afoita que,
que só vai ver quão especial eles são, quem de perto olhar
e se perto dos olhos está, as bocas se tocam com paixão! 

quinta-feira, abril 3

Amor

Ame sem medo
tenha medo de amar
amor dói, no bolso!

Nada de brincadeiras

Brincava. Do verbo brincar
Significa, modo grosso, diversão
Não, nada se pode aplicar
Quando o assunto é o coração

Brincar com o coração
Não é divertido, não

(Só para os médicos!)

terça-feira, abril 1

Mal²

Sempre que penso que algo vai mal
esse algo prova quão errada estou
não vai mal, vai horrivelmente mal
Esses desafios, Vida, tem que parar
veja bem, querida, não aguento mais
se vai mal, faça ir bem, não piore,
Porém!

quarta-feira, março 26

Do meu futuro

Essa noite, enquanto fazia minhas corriqueiras atividades
tive um vislumbre do meu futuro, e afirmo
nada como esperava, nem pior do que desejado
mas, ora, que coisa, queria ainda poder pensar mudar
e revirar ao ar meus futuros problemas e cometer erros
agora eu não tenho essa chance, e sabendo o que sei
o que resta fazer pra mudar isso, penso eu,
resta morrer, logo morta, não terei aquele futuro
e da cremação que espero, que as cinzas vão ao mar
mar de lágrimas e desespero alheio, dos que me amam
e dos que dizem amar, e que suas lágrimas falsas
completem do mar sua salinidade

segunda-feira, março 24

Fazendo história

Nos movimentos das palavras, e no brincar dos dedos sobre o papel, pesa minha alma sua subida ao céu dos encantos interiores. Brinca minha mão com os dedinhos dos pés, fazendo-os subir e descer de forma desumana, mas o cérebro não detecta dor, ele está preocupado com a poesia viva que em mim respira. 

sábado, março 22

Nem desculpas nem nada

Sinto que me aproveitei de você
te tratei como lixo
conforme as minhas necessidades

Desculpe isso, prezo mais a mim
que a você

Vadia, pensa teu ego
nada a declarar

Cassino

Era um cassino. Rolavam dados e emoções
E no canto, tudo olhando, estava você
Olhos em mim, comendo de mim minha aura
Nada fiz, dei a ti as costas e fui,
Fui para as garras da perdição

quarta-feira, março 19

segunda-feira, março 17

Datas, velhas datas

Foi um choque
e foi triste ver e saber
que depois de alguns anos
algumas datas que foram tão importantes
passaram na surdina, esquecidas, esquecidas
e o choque de olhar o calendário e dar com elas?

domingo, março 16

A sina das Marias

Maria era seu nome de batismo. Nascida em 1974. 40 anos de idade. Aprendeu a usar o computador nem bem dois anos. Primeiro movimento, criar um tal de Facebook. Todo mundo tinha Facebook, ela também precisou de um. 

Tinha uma rotina. Alimentar os filhos para a escola. Lavar a louça e então, abrir o Facebook, e ali permanecer até a hora de fazer o almoço. Apesar de adorar ficar online, pouco comentava ou curtia as postagens. Também não compartilhava muito. Seu prazer era ser voyer das postagens alheias.

Um dia isso mudou. Foi em uma tarde de chuva. A casa estava limpa, as crianças estavam fora, o marido estava dormindo. Maria gostava de olhar, uma e outra vez, fotos de seus amigos. Admirar peitorais alheios, desejar bíceps musculosos ou criticar  a beleza feminina. Abriu primeiro o álbum de fotos de Márcia, sua melhor amiga. Na primeira foto Márcia estava de perfil, metade dos seios recheados à mostra. E Maria não se conteve no pensamento: "Eu sei que esses peitos são murchos". Foto seguinte, "Que nariz ridículo. Faz uma plástica aí, Capiroto". E algumas fotos mais, ela cansou. Foi ver as fotos de Marcelo, velho amigo de infância. Primeira foto, ele e a mulher, "Mulherzinha ridícula, te chuto o rabo em gostosura. Esse homem deveria ter sido meu, vadia". Foto seguinte, ele sem camisa, "Te lambo inteiro, seu gostoso", foto seguinte, a filha dele, "Vadia igual a mãe". A seguinte foto ela não viu. O marido acordou querendo sexo.

"Esse nojento quer fazer sexo de novo". "Nem sabe mexer direito". "Que hálito podre. Escove esses dentes, seu nojento". "Melhor fingir que já gozei, pra ele acabar logo". "Goza igual um porco, roncando". "Agora dorme, nem pra transar direito. Nunca gozei com você seu estúpido". "Casar com pobre dá nisso, crianças nojentas, marido nojento". "Que nojo. Vou tomar banho".

Quando Maria voltou a abrir o Facebook, lá estavam, todos os seus pensamentos publicados. Todos. E os comentários? E as perguntas? E a falsidade? Uns elogiavam sua coragem, a parte ofendida desferia blasfêmias merecidas. Maria não podia acreditar. Ficou horas sentada na frente do computador, tentando entender o que tinha acontecido. E excluir os comentários? Impossível. E a cada pensamento seu, uma nova publicação surgia. "Que aconteceu?" "Isso não tá acontecendo comigo". Só que estava. O marido abriu o Facebook a noite, do celular leu e chorou com os comentários. Coitado, ainda apaixonado. Ter sua intimidade exposta assim. As crianças ficaram entre magoadas e divertidas. "Ela lamberia o tio Marcelo". 

Até hoje, se você abrir a página de Maria, vai poder ver seus pensamentos. É impossível excluir a conta, e após o divórcio e a solidão, sua página só deixou de receber atualizações quando Maria morreu, morreu limpamente, com uma facada no estômago. 

E assim, outra Maria, em outro lugar qualquer da minha vasta imaginação, passou a ter seus pensamentos publicados no Facebook.


sábado, março 15

Perversão

Havia sobre a mesa… pedaços humanos. Pedaços femininos. Éramos quatro à mesa. O corpo era meu, aliás é meu. Neste momento sou um espectro que revoa a mesa, olhando os outros três comensais se deleitarem com minha carne suculenta e adocicada. Eu estava sentada na cabeceira da mesa, e degustei meus próprios seios. Era minha parte preferida, macia e dura ao mesmo tempo, que uma vez trouxe leite ao meu filho e suspiro aos meus amantes. E cortando a carne em delicados pedaços, com um salpico de sal e orégano, comi na presença deles, meus dois mamilos, em primeiro lugar, e o resto devorei, igual uma porca sem educação, meti a cara no prato, lambi, suguei o sangue da carne cru, remoí pedaço por pedaço, e mastiguei com afinco. Comi sozinha, e nos olhos deles assuntei o desejo e a inveja. A vontade de provar do gosto. Mas esse deleite era meu. Dane-se a sociedade, e fodam-se os moralistas! 
Após isso, estava satisfeita, o resto era deles. Uma boa carne precisa ser amaciada. Senti cada pancada como um presente celestial. Acoitaram-me a gosto nosso. E antes de morrer pedi, um último gozo, e despejaram sobre mim seu sêmen e a última gota desceu sobre meu corpo enquanto eu subia do plano terrestre para o espiritual. E ali observei, com facas grandes e afiadas, cada pedaço arrancado e cada mordida dada em carne cru. E quando o afã passou, levaram minhas partes para a panela, e produziram um ensopado com as nádegas, e assaram as coxas, e cozinharam os pés. O resto foi sacramente ensacado. Ninguém compraria carne por um longo tempo em minha casa.
Éramos quatro sobre a mesa. Meu pai, meu marido, meu filho e eu.


Nesse fim, espero que o conto tenha cumprido com a promessa do título.
Dedico à uma amiga, super normal, que me forneceu material inspirador. To Érica.

Deixe seus comentários revoltosos.

sexta-feira, março 14

Sobre o Bar

O bar é uma vida. É a exogênese do mundo. Depois da criação dos autótrofos, eles se reuniram e criaram um bar onde podiam conversar besteiras e produzir fotossíntese. Tenho a mais absoluta certeza disso. O bar é uma entidade que leva nas costas uma horda de demônios arruaceiros. Juro! 

Alguns pensam que é um meio de vida. Ledo engano. O bar está no sangue. Está n'alma. Está onde você pensa que está, com um pormenor, o bar vive sem você e você não vive sem o bar, simples assim.

segunda-feira, março 10

Vermelho

Meus olhos estão ardendo
estou cansada

noites insones
pensamentos inquietos

meus olhos estão vermelhos
mas não de choro e mágoas

são da fumaça
estou queimando e fumando
meu coração

sábado, março 8

Egoísmo coletivo

Parabéns para mim
sou feliz, mas sofri
e sorri e vivi
e em uníssono morri!

Hoje é o dia das Mulheres. Umas palavras não bastam para confeccionar um sentido para todas as mulheres que foram felizes, ou não. Que morreram em sossego, ou agonia. E para mulheres que enfrentam todos os dias humilhações e desrespeito. Todas as mulheres devem gritam, PARABÉNS PARA MIM! Pois merecem, e juntam sussurramos em alto som.

quinta-feira, março 6

Não esqueça do amor

Não esqueça do amor
não 

Lembre-se da dor
sua

Implore por mim
querida

Não esqueça do amor
bandida

terça-feira, fevereiro 25

Isso mesmo

É, tô atacada mesmo
falando verdades 
e destruindo mentiras
dane-se o bom senso
liberto-me
e dane-se você

segunda-feira, fevereiro 24

A pessoa ao lado

Sentei ao lado de uma pessoa
pareceu simpática
me sorriu com dentes e tudo
belos olhos azuis, e verdes
belos lábios, com carne e saliva
abriu a boca, e dali saiu tudo
menos coerência
fui embora decepcionado
fui embora com ouvido em sangue

domingo, fevereiro 23

Homem sujo

Um homem sujo. Longa barba, longo bafo. Orarei por sua alma. Não darei o dinheiro. Ele vai consumir em álcool e bebidas. 
Um homem sujo. Senti pena. Não ofereci comida. Nem nada. Orarei por sua alma, no céu não vai ter fome. 
Um homem sujo. Morto na calçada. Chamei a polícia. Que barbaridade.

sábado, fevereiro 22

Beronha

E tinha uma beronha
e a beronha sozinha estava
cantado suas dores ao mundo
e veio um vento suave que ela gostou
e uma chuvinha fina que ela adorou
e que abrasou as dores da beronha
beronha tola, morreu feliz
com inseticida

há tantas beronhas no mundo
morrendo felizes com inseticida
e há tantos tipos de inseticida
que me dá pena pensar
na felicidade (...) alheia

quinta-feira, fevereiro 20

Neurótica

Descobri, assim, meio sem querer
uma coisa antiga, do passado, diria
e foi sua primeira namorada, da escola
e você disse uma vez, que não, jamais

Não era de se esperar sua sinceridade
escondendo de mim seu passado escuro
suas mentiras cruéis, seu canalha desgraçado

Vou dar um basta, viu?
cortar sua cabeça, arrancar seu coro
furar suas tripas... 

Tchau, amor
também te amo!

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